Um negro saxofonista debaixo de um chapéu de feltro cinza derramava jazz pelos ouvidos de uma platéia imersa em uísque & cigarros. As notas tocadas tinham o gosto amanteigado da saliva impregnada no bocal do saxofone - todos sentiram. O músico sabia que estava com todas aquelas mentes hipersensibilizadas sob o seu controle, mas evitou apoderar-se delas. Colocou-se apenas como o canal que permitia a existência de uma consciência ativa flutuante, comum a todos, catalisada pela fumaça nociva que preenchia a espelunca calorenta. Uma consciência coletiva, sem que fosse a MESMA para cada espectador. Uma consciência que se renovava constantemente e sempre que necessário, mantida por meio da telepatia de vibrações mais sutis que os enigmas taoístas.
No clímax da sessão, o negro saxofonista não mais distinguia as formas das pessoas aglomeradas, a não ser os olhos como uma série de pares de intensas lâmpadas incandescentes e os crânios como rãs amazônicas coaxando. Quando sentiu a proximidade da beira do êxtase da comunhão, encheu os pulmões e fez seu instrumento gritar até enrouquecer e enlouquecer os hormônios do público. Aquele rugido ancestral anunciou a presença faminta e implacável da Morte espreitando vítimas jovens e tenras para alimentar-se. Como Ela jamais blefa e só é possível despistá-La com sorte e por alguns instantes, após o fim do rugido, restou apenas o silêncio denso de presas ofegantes, bombardeadas de adrenalina e estagnadas em alerta.
(...)
Depois de estabilizadas em sinergia institiva as batidas de cada coração, os espectadores perceberam aliviados e prazerosamente satisfeitos que haviam saído daquela experiência com vida e melhores do que eram antes.
Ninguém aplaudiu. Ninguém aplaude depois do orgasmo.
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mas me veio o album workin' do miles davis quintet na hora!
ResponderExcluirtá o link de uma desse album:
http://www.youtube.com/watch?v=IZ5U4sMYTWA